Concurso, CorreioWeb, Brasília, DF

Tosco & cia.

''Deus usa o silêncio para ensinar sobre a responsabilidade das palavras.'' Paulo Coelho

07/08/2019 08:00

Dad Squarisi

Palavras viram moda sem querer. Ninguém as inventa. Elas estão quietinhas, guardadas no baú da língua. Aí, acontece. Alguém as tira de lá. Surpreende. As antes desconhecidas ganham notoriedade. Há exemplos pra dar, vender e emprestar. Quer ver?


Marajá

Fernando Collor descobriu marajá. Buscou-a na Índia. Lá, o vocábulo dava nome aos príncipes e endinheirados do país. Aqui, passou a designar o funcionário público que recebe altos salários. Mas o alagoano generalizou. Botou no mesmo saco os privilegiados e os barnabés. Virou piada.

Nhem-nhem-nhem

FHC lançou o nhem-nhem-nhem. Pescou-o no tupi. Na língua dos índios, o trio quer dizer falar, falar, falar. Na nossa, mais ou menos a mesma coisa. É resmungo, falação interminável.


Tró-ló-ló

O tucano José Serra ressuscitou tró-ló-ló. A danadinha tem origem onomatopaica. É como au-au, miau-miau, toque-toque. Imita vozes ou ruídos. Os três monossílabos significam música ligeira, fácil de entoar. Por extensão, conversa vazia, lero-lero.

Tosco

Bolsonaro não é o autor. Mas inspirou a palavra tosco. A dissílaba virou praga. É um tal de discurso tosco pra cá, debate tosco pra lá, trabalho tosco pracolá. A popularidade provocou corrida ao dicionário. De onde vem a ilustre criatura?


Nada bom

Os romanos desprezavam os moradores de Vicus Tuscus, bairro romano onde viviam os etruscos. Deram, por isso,  acepção pejorativa a tuscus, que passou a significar devasso, vil, libertino. Com o tempo, perdeu-se esse sentido. Hoje, tosco quer dizer tal como veio da natureza, bronco, rude. Em bom português: sem refinamento.

Por falar em onomatopeia...

Muitos reclamam da reforma ortográfica. Mas ela deu ajudinhas a nós, falantes da língua portuguesa. Uma delas é simplificar o emprego do hífen. As onomatopeias servem de exemplo. Ora se escreviam com o tracinho. Ora sem. Agora todas se grafam separadinhas, sem possibilidade de contato. É o caso de nhem-nhem-nhem, tró-ló-ló, blá-blá-blá, tique-taque, toque-toque, quem-quem, lenga-lenga, tim-tim por tim-tim.

Mesmo time

O prefixo co- tinha parceria com as onomatopeias. Lidar com ele era baita confusão. Ora pedia o tracinho, ora dispensava-o. Com o acordo, a novela mudou o enredo. O pequenino nunca aceita hífen. Com ele é tudo colado: coautor, coerdeiro, corréu, correpresentante, comorador, coinquilino, correpresentante, coprodução, cossecante. Etc. Etc. Etc.


Idem

A história se repetiu com o não. Antes, só o dicionário sabia quando usar o tracinho e quando dispensá-lo. A reforma deu um ponto final no quebra-cabeça. Mandou o hífen plantar batata beeeeeeeeem longe. Oba! As três letrinhas ficaram livres e soltas — sem lenço e sem documento: não agressão, não alinhamento, não conformismo, não fumante, não intervenção, não participação, não alinhado, não beligerante, não combatente, não conformista, não intervencionista, não ferroso, não verbal, não viciado. Ufa!


Da internet

A frase circula na rede. As pessoas a leem. Algumas riem. Outras ficam sérias. Há as que se irritam. Mas nenhuma fica indiferente. E você? Faça o teste:

“Ter duas mulheres não, é errado! Errado é você ler sem respeitar a vírgula.”

Leitor pergunta

Se o plural de ar-condicionado é ares-condicionados, como devo escrever no plural: aparelhos de ar condicionado ou aparelhos de ares condicionados?
Joaquim Leite, Brasília

A língua é econômica que só. Se um termo dá o recado, nada de gastar dois: aparelhos de ar condicionado, aparelhos de jantar, jogos de xadrez, partidas de futebol.

Olho vivo! Há casos em que o complemento é plural. Aí, a dose é dupla: um grupo de alunos (dois grupos de alunos), um par de sapatos (três pares de sapatos), uma coleção de selos (duas coleções de selos).

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