Concurso, CorreioWeb, Brasília, DF

Apesar da crise econômica, concursos continuarão sendo necessários

A conclusão de especialistas é que vale a pena continuar estudando

23/01/2017 09:24 | Atualização: 23/01/2017 10:10

Wenderson Oliveira*

O arrocho fiscal que começou no governo de Dilma Rousseff se perpetua na gestão de Michel Temer e afeta os concursos públicos, justamente no período em que eles se tornam mais atraentes: afinal, num país com mais de 12 milhões de desempregados, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o sonho da estabilidade é ainda mais interessante. A boa notícia é que seleções continuarão sendo necessárias para repor postos vagos, em muitos casos, por causa de aposentadorias. A Lei Orçamentária Anual (LOA), publicada no Diário Oficial da União em 11 de janeiro, prevê um máximo de 21.973 cargos vagos no setor público federal para 2017 — 6.499 a mais do que o estipulado no projeto inicial. O documento reserva até 18.690 para o Poder Executivo, 2.319 para o Poder Judiciário, 239 para o Poder Legislativo, 44 para a Defensoria Pública da União (DPU), 681 para o Ministério Público da União (MPU) e uma para o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

Procurado, o Ministério do Planejamento não concedeu entrevista, mas informou, em nota, que as contratações no Poder Executivo Federal continuarão suspensas em 2017 (assim como estavam em 2016) a fim de diminuir gastos. A LOA estabelece um teto de oportunidades para essa esfera, que só poderão ser usadas em situações excepcionais, como nomeações de certames previamente autorizados, atendimentos de demandas judiciais, substituição de terceirizados (7.113) e fixação do efetivo das Forças Armadas e das polícias e bombeiros do DF (1.074). O DF, os estados e os municípios seguem promovendo concursos públicos de acordo com a realidade econômica de cada um. A Lei de Diretrizes Orçamentárias do Distrito Federal (LDO) prevê até 6.826 vagas para provimento de pessoal em Brasília este ano, incluindo 75 oportunidades para a Câmara Legislativa (CLDF).

Previsão nacional

A Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac) estima que cerca de 85 mil oportunidades sejam abertas em seleções no país nas esferas federal, estadual, municipal e distrital em 2017. Em 2016, a previsão girava em torno de 100 mil. O presidente da Anpac, Marco Antônio Araújo, explica que a redução de expectativa é motivada pela crise. São esperadas ainda 25 mil vagas exclusivas para cadastro de reserva. “Os concursos são abertos com a obrigatoriedade de contratar uma quantidade mínima de pessoal, mas, caso a receita melhore, dá para buscar mais candidatos. Por isso, na situação atual, o cadastro de reserva é uma forma coerente de a administração pública equilibrar o orçamento”, avalia.

Ele alerta que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55 (antes PEC 241), despachada à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados, afeta o panorama de certames porque impõe a contenção de gastos governamentais. Apesar do cenário de crise, o presidente da Anpac, Marco Antônio Araújo, ressalta que o governo continuará contratando porque a máquina pública não pode parar. “A crise é oportunidade para o concurseiro, ainda que haja diminuição de vagas.”

Segundo ele, “2017 e 2018 serão muito fortes para seleções”. A necessidade de contratação pode ser intensificada, uma vez que há funcionários públicos acelerando o processo de aposentadoria para não serem prejudicados por novas regras da reforma previdenciária. O quadro de falta de mão de obra por esse motivo é grave em órgãos como Receita Federal e Banco Central (Bacen), segundo Victor Maia, fundador do QualConcurso, software on-line baseado em estatísticas que auxiliam no planejamento personalizado dos estudos, e mestre em estatística pela Universidade de Brasília (UnB). “Cargos precisarão ser repostos sob o risco de comprometer o funcionamento da máquina pública”, garante.

Ademais, de acordo com a Anpac, existe acúmulo de serviço em postos importantes, como o de auditor-fiscal do trabalho (Ministério do Trabalho) e os de analista e atendente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Outro aspecto a se considerar para a abertura de vagas é a concentração de trabalhadores terceirizados em entidades como a Polícia Federal, que solicitou autorização ao Ministério do Planejamento a fim de abrir concurso, e as agências reguladoras em geral.

As esferas legislativa e judiciária não passam por tanta restrição. “Há perspectiva com relação ao Senado Federal, à Câmara dos Deputados e à CLDF”, observa Victor Maia. “Este será o ano para os concursos de tribunais, com destaque para os eleitorais. É possível estudar os mesmos conteúdos para vários certames da área. A seleção do Tribunal Superior do Trabalho (TST) não está na LOA, mas nada impede que o governo a inclua no orçamento”, complementa Arthur Rodrigues, coordenador pedagógico do Estratégia Concursos e engenheiro aeronáutico pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).
 

Minhas chances

Não é novidade que é preciso se preparar com antecedência para ter sucesso em concursos. Num período de seca de certames, é ainda mais crucial dominar matérias básicas — como português, raciocínio lógico, informática, processo legislativo e direitos constitucional e administrativo — antes da divulgação do edital. “Quem está se preparando sai na frente e pode ter a oportunidade agora”, afirma o presidente da Anpac, Marco Antônio Araújo.

Victor Maia, do QualConcurso, ressalta que quatro em cada cinco candidatos não estarão em condições de aprovação nos próximos 12 meses. Por isso, o fato de 2017 ser um ano de vacas magras no serviço público não é uma notícia totalmente ruim: só é um fato infeliz para os cerca de 2% de concurseiros que estão bem preparados. “Muitos dizem que estudar para concurso é como entrar numa fila, mas, se você utilizar os melhores métodos e materiais, consegue passar na frente de muita gente”, opina Arthur Rodrigues, do Estratégia Concursos.
 

NÚMEROS

21.973
teto de vagas nacional (LOA)


6.826
teto de vagas no DF (LDO-DF)

85 mil
oportunidades previstas 
pela Anpac para concursos 
em todo o país
 

Fale, concurseiro!

 

Meu segundo emprego
Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press

Cientista política pela UnB, Gabriela Pontual, 25 anos, é servidora num cargo de nível médio no Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic). Por se tratar de uma função que não envolve o conteúdo que estudou na faculdade, a paranaense busca outra oportunidade. O objetivo dela é conseguir uma vaga de analista legislativa na Câmara dos Deputados. Ela dedica em torno de três horas por dia à preparação. “Tenho que pensar positivo e continuar a estudar, porque o certame terá uma concorrência absurda”, diz. Ela também espera fazer o exame da Câmara Legislativa do DF e se desdobra para cumprir as demandas do trabalho atual e estudar no período noturno. “É como um segundo emprego”, explica. Um segredo para se manter disposta e dar conta do recado é acordar cedo para malhar e praticar futevôlei. As disciplinas em que a jovem mais tem dificuldade são raciocínio lógico e informática, ao passo que direito constitucional é algo que não a preocupa.


Mais de 40 horas de dedicação
Gabriela Studart/Esp. CB/D.A Press

Desde que se formou em engenharia civil pela UnB, em 2014, Leonardo Leão, 26, se dedica somente aos estudos para concurso. “Nunca foi a primeira opção, mas, no fim da graduação, vi que o mercado estava muito ruim”, justifica. O brasiliense acredita que 2017 será muito melhor que 2016 em termos de oportunidades no serviço público. O sonho de consumo dele é o cargo de perito em engenharia civil na Polícia Federal. Enquanto o edital não sai, o rapaz estuda para outras provas com data marcada: Corpo de Bombeiros do DF, Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF), Polícia Militar do DF, e Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (Terracap). Ele se interessa ainda pelo certame da Polícia Legislativa do Senado. O brasiliense está no pico da motivação e diz que estaria em boas condições se o edital da Polícia Federal saísse hoje. Leonardo faz cursinho presencial de manhã, frequenta uma biblioteca durante a tarde e participa de cursos on-line à noite. “Meu trabalho é esse: estudo 40 horas semanais, sem contar as manhãs de sábado e domingo.” Mesmo tendo facilidade em português, essa é a disciplina que mais o preocupa, uma vez que é cobrada na parte discursiva e traz questões objetivas cada vez mais difíceis.

 
Imersão diária
Gabriela Studart/Esp. CB/D.A Press

Concurseira desde janeiro de 2015, Rayana Mendes, 27, formada em relações internacionais pela Faculdade Integrada do Recife, pediu exoneração do cargo comissionado que ocupava no Ministério da Defesa para se dedicar exclusivamente aos estudos para concursos. “Decidi largar tudo e voltar para a casa dos meus pais. Recebi propostas de emprego, mas, quando se começa a estudar e ficar mais perto do objetivo, não tem porque desistir”, frisa. O foco dela está em oportunidades na Câmara dos Deputados, mas a jovem também tentará vagas em seleções distritais. Para se motivar, ela mantém amizade com outros concurseiros, participa de grupos temáticos e segue professores em redes sociais. “Tento respirar concurso”, conta. Por um lado, administração geral, gestão de pessoas e informática são as disciplinas que a pernambucana menos domina. Por outro, ela diz que dá show em português, direito constitucional e atualidades. Rayana estuda em média cinco horas por dia.

* Estagiário sob supervisão de Ana Paula Lisboa

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