Desistir, nem com dor
A enfermeira Alice Vanazzi, em um concurso do ano passado para a prefeitura de Ariquemes, em Rondônia, preferiu sentir dor a desistir de realizar a prova. “Eu deixei de ir a um posto de saúde, mesmo com um corte acima da sobrancelha esquerda. Após o almoço, ao entrar no carro eu imprensei a cabeça entre o carro e a porta. Eu morava em Porto Velho, Rondônia, e estava numa cidade que não conhecia. Se fosse procurar um posto de saúde para fazer sutura, perderia o concurso. Lembro que coloquei um pedaço de papel higiênico no corte e todos na sala olhavam pra mim. Acabei em 28º lugar na classificação final da seleção. Faria o mesmo novamente e ainda espero ser chamada”.
A eterna corrida contra o tempo
Natália Carin, licenciada em letras, buscava uma vaga no concurso da Polícia Militar de Minas Gerais em agosto de 2015. Mesmo saindo de casa, em Belo Horizonte, com uma hora de antecedência para fazer a prova ela não foi poupada da tensão de não conseguir chegar no horário. “Fiquei parada no trânsito por 40 minutos. Quando faltavam 15 minutos para fazer a prova eu desci do carro e corri, desesperada, abordei motoqueiros e ofereci dinheiro para que me levassem até o local. Ninguém aceitou, então voltei para o carro e meu marido dirigiu a uma velocidade altíssima. Consegui chegar e assim que cruzei a passagem, o portão foi fechado atrás de mim”. Apesar da correria, Natália não passou no concurso, mas diz que a experiência foi um aprendizado por mostrar que é preciso estar preparado para enfrentar os contratempos e se organizar melhor para que eles não aconteçam.
Local ruim
A comerciante Renata Netto mora em Conselheiro Lafaiete, em Minas Gerais, e em abril deste ano foi prestar o concurso para a prefeitura de Barbacena, também em Minas Gerais. Segundo ela, a organização do concurso fez com que as condições para chegar no horário para realização da prova fossem dificultadas. “Eram 10 km até o campus da Universidade onde a prova seria aplicada, sendo 2 km de estrada de terra. O caminho era de apenas uma via e a estrada de terra era super estreita. Para sair era preciso passar por dentro do campus. O congestionamento fez com que candidatos tivessem que abandonar os carros e ir a pé. Alguns conseguiram pegar mototáxis. Eu continuei no caminho e tive paciência somente porque aquela não era uma prova que eu tinha urgência em passar, mas não custava tentar. Mesmo com a prova marcada para as 14h, consegui entrar com meia hora de atraso. Tudo por causa da falta de organização do concurso, pela escolha de um local ruim”. Para Renata, as condições para realização da prova foram um desrespeito com as pessoas que se dedicaram e se prepararam para a seleção.
Dia de má sorte
O servidor público municipal Érico Nocrato realizou no último mês de abril a prova do concurso para o IBGE em Tianguá, Ceará. Ele precisou fazer sacrifícios e passou por situações surpreendentes. “Combinei com um amigo, que faria a prova, para viajarmos em seu carro e dividirmos as despesas de combustível. De onde moramos, Paracuru, até Tianguá enfrentamos uma viagem de quase 300 km. No caminho decidi pegar um atalho, que encurtaria a viagem em 30 km. Percebi que não era nada disso. Era uma estrada de terra cheia de buracos e deserta. Perdemos cerca de uma hora nessa escolha, mas houve outro imprevisto. Entre Sobral e Tianguá, um pneu furou e paramos para colocar o único estepe que havia no carro. Além disso, viajei com febre chicungunha e estava com muitas dores nas articulações. Mas conseguimos enfim chegar a Tianguá. Só faltavam 55 minutos para começar a prova, e cada um faria os exames em um local diferente, e nenhuma pessoa que abordamos tinha ideia de onde ficava. Mas, apesar de ficar sem almoço, acabamos encontrando os locais”. Como se não bastasse, após o término da prova, Érico ainda bateu o carro e furou outro pneu. Ele afirma que mesmo tendo passado por tantos apuros, a estabilidade no emprego ainda é objetivo de sua vida e que todo esforço vale a pena para conquistar seu sonho.
Três vezes pode pedir música
A assistente administrativa Joyce Carvalho contou que, em 2015, ela e o namorado participaram da seleção da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, para o cargo de produtor cultural. A eventualidade chega a ser engraçada. “Fomos fazer prova em Feira de Santana, que fica cerca de 100 km de onde moro, em Salvador. Viajamos no final da tarde do dia anterior à prova. Não estava a fim de pegar peso, então coloquei na minha mala somente o básico. Faríamos a prova no período da tarde. Ao terminarmos o almoço, resolvemos ir andando até o local de prova. Comecei a caminhada e de repente percebi que o solado do meu sapato descolou no meio. Fiquei descalça, mas desisti de andar porque o sol estava escaldante e queimava demais os meus pés. Cansada, sentei no meio-fio de uma calçada, tirei os óculos e comecei a chorar. Meu namorado teve a ideia de bater em alguma casa para ’comprar’ ou pedir um chinelo emprestado. No momento em que ele estava já se dirigindo a uma residência, um mototaxista se aproximou e ele pediu para que o levasse em um mercado para comprar um chinelo para mim. Quando faltavam cinco minutos para os portões fecharem, ele chegou com um chinelo. Corremos e adentramos no colégio. Quando entrei, uma fiscal veio me perguntar se estava tudo bem e se eu queria água para me acalmar. Daí, quando levei a mão ao olho para enxugar minhas lágrimas eis outro dilema: ‘Cadê meus óculos?’. Faltavam apenas dois minutos para os portões fecharem, mas a fiscal me encorajou a achar os óculos. Acabei achando. No final, passei na prova escrita em quarto lugar, mas não passei na prática por apenas um ponto. Fiquei com a lição de que quando for fazer prova preciso sair bem preparada, inclusive com um chinelo reserva na bolsa”.
Joyce já havia passado por outras duas situações anteriores. Em 2013, a história foi inusitada e até perigosa. “Naquele ano, fui fazer uma prova para a Universidade Federal da Bahia, no cargo de assistente administrativo, e peguei carona com um estranho porque perdi o único ônibus que passava no local. Cheguei na rodoviária e recebi a notícia de que o próximo transporte passaria em duas horas. Eu tinha apenas uma hora e vinte minutos pra chegar, mas mesmo assim resolvi esperar o ônibus. Chegou uma moça que ia fazer a prova no mesmo local que eu e avisei a ela sobre o problema do transporte. Ela disse que o marido dela estava por perto e poderia nos levar. O cara estava muito bêbado e disse que queria até batizar a gente com a ‘pinga da aprovação’. Perigos à parte, chegamos sãs, salvas e antes dos portões fecharem. Agradeci imensamente, mas infelizmente não passei na prova, se isso foi porque rejeitei a ‘pinga da aprovação’, não sei”.
Saiba Mais
Em 2014, Kleytom Costa, o namorado da assistente administrativa, teve uma parcela de culpa no sufoco que ela passou. Eles fariam a prova da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), órgão em que ela trabalha atualmente. O combinado era sair com duas horas de antecedência. Mas não foi o que aconteceu. “Eu estava esperando, mas ele não aparecia. Continuei esperando, até que resolvi ir até a casa dele. Quando cheguei na rua, encontrei o ‘dito cujo’ de chuteira, meião e sem camisa, ou seja, estava no futebol. Ele me convenceu a esperá-lo e assim eu fiz. Nesse meio tempo, caiu um temporal. Comecei a me desesperar porque faltavam somente 30 minutos para chegar ao local, a chuva estava forte e a cidade, engarrafada. Meu namorado resolveu chamar um táxi para nós. Ele explicou que estávamos atrasados para o concurso e o taxista seguiu por caminhos alternativos. Enquanto isso, eu cantarolava todos os mantras possíveis pra não voar no pescoço do meu namorado. Chegamos faltando cinco minutos para o fechamento dos portões. Fiz a prova na adrenalina, mas passei, e hoje trabalho no órgão para o qual prestei esse concurso. Valeu o sufoco, mas quando acabei a prova ainda fiquei esperando meu namorado por duas horas por que ele saiu antes de mim e foi assistir jogo. Ele não tinha aprendido a lição”.