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“Muitos concurseiros têm o hábito de estudar nas primeiras horas do dia porque o telefone não toca, o vizinho não liga o som alto, há menos distrações e ruído. Isso ajuda a manter o foco e pode aumentar o rendimento e a concentração”, observa o professor de direito constitucional do Impacto Rodrigo Francelino, idealizador dos aulões durante a madrugada. Rodrigo e o professor de direito constitucional Orlando Júnior, que ministraram aula sobre Lei Orgânica do Distrito Federal e direito constitucional na última edição, constatam que o perfil daqueles que procuram esse tipo de curso é variado e costuma ser de pessoas focadas.
Além do conteúdo, a programação inclui lanche e atrações, como apresentações de stand up comedy. André Lopes, coordenador-geral do grupo Impacto, explica que um dos objetivos é democratizar o acesso às aulas para pessoas que não podem comparecer durante o dia. “65% das pessoas que comparecem não são alunos do cursinho, é uma proposta que desperta o interesse.” Ele acredita que a dinâmica prende a atenção, por isso funciona. Lopes argumenta, porém, que não é algo que deve ser feito com muita frequência. “Promovemos o aulão de quatro a cinco vezes ao ano. Se for demais, desgasta estudantes e funcionários.”
Alunos notívagos
A mãe de Leila Santiago, 24 anos, a chamou de louca quando a filha disse que compareceria a um aulão de madrugada, mas ela explica que é uma pessoa noturna e que precisa aproveitar enquanto ainda tem fôlego. Funcionária da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Leila garante que não desanima durante esse tipo de aula por conta dos professores e das piadas que prendem a atenção. “O método é muito eficiente, acredito que vai pegar. Quero ser delegada da Polícia Federal, por isso estou aqui. Essa vaga é minha.”
Vinícius Alves, 20 anos, trouxe reforços para o aulão — sua fiel companheira: uma garrafa térmica com café. “Passar a madrugada toda estudando pode ser desgastante, e a cafeína ajuda com o cansaço e me deixa mais acordado”, comenta. Apesar de jovem, Vinícius tem esposa e uma filha de três anos e busca um cargo público na Agepen. Essa foi a primeira vez que o jovem compareceu a um aulão do estilo. “Esse método pode dar certo, já que motivação é essencial, e o horário de estudo não importa.”
O primeiro do DF
O pioneiro no estilo no Distrito Federal foi o Gran Cursos, que ofereceu a primeira aula de madrugada em 2000. Há dois anos, a instituição parou de oferecer a opção. “A pedido dos alunos, começamos a fazer o LuAula, da 0h às 6h, com resolução de exercícios e conteúdo das principais matérias de um concurso específico. Nas ocasiões, promovíamos shows musicais, sorteios de brindes, atividades de relaxamento e café da manhã. Havia também uma turma regular com conteúdos básicos de concurso com aulas de madrugada das 23h às 2h. Mas os tempos mudam, e os alunos passaram a preferir fazer cursos de madrugada on-line, sem ter que se locomover; então interrompemos o projeto”, conta o professor de direito administrativo e administração pública Wilson Granjeiro, dono do Gran Cursos.
Esforço em vão
A mudança nos horários pode ser prejudicial para o cérebro, pois vai contra a fisiologia do corpo. Algumas pessoas dizem funcionar melhor de madrugada, mas, em longo prazo, esse processo pode causar exaustão mental e comprometer a produtividade e o rendimento do estudo. Em situação de ansiedade prolongada, o cortisol — conhecido como hormônio do estresse —, vai para a região de cérebro responsável pela memória e compromete a fixação, podendo levar a exaustão, fadiga mental ou até mesmo depressão.
O aumento da concorrência e a busca por empregos e salários melhores levam as pessoas a quererem superar limites físicos. Porém, passar a madrugada estudando não é o mais eficaz. O corpo precisa manter um contexto de hábito de estudo, com horários estabelecidos e pausas regulares de descanso, porque o cérebro fixa o que aprendemos enquanto dormimos. Sem descanso apropriado o esforço é em vão. Se a prática for esporádica, pode ser que não seja prejudicial. A complicação está nas últimas semanas antes do exame. Se o estilo de estudo muda repentinamente em uma data muito próxima da prova, o cérebro pode não conseguir acessar as informações.
Flávia Martins, mestra em cognição e neurociência do comportamento